Peças publicitárias em jornais e redes sociais da RBS destacam nesta sexta-feira (3) depoimentos de jornalistas de países sem liberdade de imprensa, como a Síria e o Irã
O Grupo RBS preparou uma série de ações para esta sexta-feira (3), Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. Os jornais Zero Hora e Diário Catarinense apresentarão uma série de cinco anúncios com depoimentos de cinco jornalistas que vivem em países sem liberdade de imprensa: Mazin Albalkhi, da Síria, Pooria Jafereh, do Irã, Giang Nguyen, do Vietnã, Farhan Jimale, da Somália, e Madrigos, do Turcomenistão. Os países em que atuam estão classificados entre as dez últimas posições do ranking sobre Liberdade de Imprensa da ONG Repórteres Sem Fronteiras que reúne 179 países.
Nos textos, os repórteres ressaltam a importância de ter uma imprensa livre e os desafios de quem é impedido de exercer o princípio básico da profissão de jornalista como forma de destacar a relevância do tema e da data para toda a sociedade. Além de DC e ZH, os demais jornais do Grupo RBS publicarão um anúncio de página inteira para registrar a importância do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. A agência DM9Sul, idealizadora da ação, foi em busca de jornalistas no Irã, Síria, Somália, Vietnã e Turcomenistão para falar sobre liberdade de imprensa.
Nas páginas 4 e 5, ZH e DC trazem reportagem especial tratando o tema editorialmente. Os demais jornais da RBS também abordarão o assunto. Nas redes sociais do Grupo RBS (Facebook, Twitter e Instagram), será publicado um depoimento do presidente emérito, Jayme Sirotsky, sobre o assunto, assim como trechos dos textos dos jornalistas.
Confira a íntegra da ação no site do Núcleo RBS de Divulgação (http://gruporbs.clicrbs.com.br) e nas redes sociais do Grupo RBS e na matéria publicada nesta sexta-feira (3) nas páginas 4 e 5 de Zero Hora e do Diário Catarinense.
Sobre o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa
O dia 3 de maio foi proclamado Dia Mundial da Liberdade de Imprensa em 1993 pela Assembleia Geral das Nações Unidas. É uma oportunidade para discutir o tema, mostrando à sociedade a importância de valorizar a liberdade de imprensa a nível mundial, defender os meios de comunicação de ataques a sua independência e homenagear os jornalistas que perderam a vida no exercício da profissão. É também uma ocasião para falar de violações à liberdade de imprensa e sobre como dezenas de países ao redor do mundo têm publicações censuradas, suspensas ou anuladas, enquanto jornalistas e veículos são atacados, presos e até assassinados. A data remete ao aniversário da Declaração de Windhoek (Namíbia), em 3 de maio de 1991, quando foi acertado que a liberdade, a independência e o pluralismo dos meios de comunicação são princípios para a democracia e os direitos humanos.
O ranking da liberdade de imprensa
A organização internacional Repórteres Sem Fronteiras elabora anualmente um ranking indicando as posições dos países quando ao índice de liberdade de imprensa de que usufruem. No ranking 2013, com 179 países, a nação com maior liberdade de imprensa é a Finlândia, e a pior é a Eritrea (África). O Brasil ocupa a 108ª posição. Para conferir a lista na íntegra, acesse: http://en.rsf.org/press-freedom-index-2013,1054.html
A íntegra dos depoimentos
"Se alguma coisa fica clara a partir do grande número de veículos de mídia vietnamitas, estimado em cerca de 700 em um país de mais de 90 milhões de habitantes, é o fato de que todos eles se reportam a um único editor-chefe, o Chefe do Departamento de Propaganda e Educação do Comitê Central do Partido Comunista do Vietnã (CPV).
Ainda assim, apesar do rígido controle comunista sobre a imprensa, surgiu um pulsante ambiente de mídia, após duas décadas de reformas econômicas e, até recentemente, um processo de relaxamento político e abertura ao mundo. A questão aqui é entender como o CPV administra tudo isso.
No Vietnã, um país com 35 milhões de usuários de internet e mais de 10 milhões de cadastrados no Facebook, há milhões de sites privados, fóruns e blogs que tornam bastante real a sensação de ser livre para trocar comentários sobre as más ações do Governo e do Partido.
Ao mesmo tempo, o número de jornalistas, escritores e blogueiros que são perseguidos pelo poder judiciário comunista vietnamita aumentou nos últimos quatro anos, porque o governo determinou medidas severas para sufocar a liberdade de imprensa, seja por meio de censura ou de vigilância e até prisões, de acordo com organizações como a Human Rights Watch (HRW), a Repórteres sem Fronteiras (RSF), o Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) e os governos ocidentais.
No momento em que escrevo este texto, Nguyen Phuong Uyen, 21 anos, uma jovem estudante da província de Long Na, no sul do país, está aguardando julgamento por ter disseminado folhetos antigoverno, de acordo com o jornal Tuoi Tre, que cita a polícia vietnamita. O blogueiro Le Quoc Quan, 42 anos, aguarda julgamento com base em acusações semelhantes.
Controle seletivo
Como ninguém que não seja afiliado ao único partido supremo pode ser promovido para assumir um cargo público no Vietnã, a ideologia comunista dá aos editores, jornalistas e donos de veículos orientação direta com relação ao que dizer e publicar. Aqueles que ousarem desrespeitar as regras podem ter suas carreiras prejudicadas. Em março passado, o jovem jornalista Nguyen Dac Kien perdeu seu emprego no jornal Família e Sociedade 24 horas depois de ter postado em um blog uma crítica ao líder do Partido, Nguyen Phu Trong. Jornalistas jovens não podem se envolver em ações sociais que potencialmente possam levar a um movimento como a Primavera Árabe, argumentou o Partido.
Confusão caótica
A falta de clareza sobre o que é permitido ou não criou uma situação de confusão, conforme se percebe no Exterior.
Por um lado, a mídia vietnamita é livre para publicar todo tipo de notícia do mundo, desde o último show de Beyoncé e o estilo de cabelo peculiar de King Yong-um às negociações sobre armas nucleares iranianas ou às supostas ligações financeiras entre Kaká e Estevam Hernandes Filho. Por outro lado, a política vietnamita e a vida pessoal dos principais líderes e seus familiares continuam sendo um terreno proibido e, às vezes, determinadas notícias sobre China, Cuba e Rússia são censuradas, devido ao nível de sensibilidade.
Como o Partido não oferece recursos para manter centenas de jornais, notícias sobre estupros cometidos por gangues, assassinatos brutais ou conteúdos sexuais explícitos são formas de ajudar a vender anúncios ou atrair tráfego online. Como a maioria deles não tem correspondentes estrangeiros, apropriar-se de reportagens e surrupiar imagens e vídeos de uma mídia estrangeira é um lugar-comum, tornando a violação de direitos autorais um problema sério no Vietnã.
Conclusão
A censura à mídia no Vietnã não é total, mas seletiva e destinada a impedir a democratização da sociedade. Ela permite à mídia administrar seus próprios assuntos em um ambiente claramente comercializado, colocando em questão a integridade da mídia oficial vietnamita.
De maneira geral, o Vietnã é um lugar onde a liberdade de imprensa não é apenas restringida por uma antiga versão da ideologia comunista, mas também comprometida por um mercado em que não há estado de direito nem confiança da sociedade na situação da mídia.
"Andrea Parrot, ex-diretor do Museu do Louvre disse: “cada pessoa civilizada no mundo deve admitir que tem dois países natais: aquele em que nasceu e a Síria”.
Considerando que a Síria é o berço de todas as civilizações, esse país de onde eu vim, mas agora, como milhões de sírios são chamados de refugiados, eu também sou chamado de refugiado no Egito. Eu tive de deixar o meu país há dois anos, porque fui condenado por protestar contra o regime de Assad. Esse regime controla a Síria desde 1970. Hafiz Assad, o ex-presidente da Síria, matou 70 mil civis no início de 1982. Agora seu filho Bashar Assad está realizando a mesma missão. Ele matou 100 mil civis até o momento. Ambos mataram os sírios porque as pessoas ousaram pedir liberdade e dignidade. Em 18 de março de 2011, dois civis da região sul da Síria – Daara – foram mortos a tiros, quando protestavam contra o regime pedindo que Atif Najib, primo do presidente (o chefe da Segurança Militar em Daraa), libertasse as 15 crianças que escreveram no muro de uma escola “as pessoas querem derrubar o regime” e, quando Ayash e Jawabra foram mortos, a revolução começou na Síria. A primeira exigência foi “vamos nos expressar”. Um dos maiores slogans foi dito por um manifestante sírio que gritava: “SOMOS SERES HUMANOS, NÃO ANIMAIS”.
Decidi escrever para vocês porque sou um ser humano, como aquele homem gritou antes há dois anos. Nós fomos criados humanos livres, não escravos. Sei que esse ensaio é um ensaio suicida em meu país, mas esta é uma boa oportunidade de provar a mim mesmo diante de vocês que sou um ser humano e posso escrever e me expressar. A primeira oportunidade de me expressar foi em 2006, quando eles me ligaram de uma TV nacional para participar de um talk show. Antes de ir ao ar, o diretor nos informou sobre os 3 “NÃOs...”: não fale sobre política, não fale sobre a longa duração do treinamento militar e não fale se não lhe dermos permissão para isso.
Agora, pela primeira vez, estou infelizmente fazendo isso, estando fora do meu país. Isso está acontecendo enquanto meu povo dentro da Síria está morrendo com as armas químicas do regime sírio."
"O Turcomenistão é conhecido por suas ricas reservas de gás natural, estando na quarta posição no mundo. A economia do país está prosperando, a renda per capita é listada entre os países médios; o petróleo e o gás fluem para o exterior, trazendo de volta bilhões de receitas em moeda forte; a população desfruta do livre uso de serviços públicos municipais, energia elétrica, gás, água, sal de cozinha e determinadas quantidades de combustível para veículos.
Mas...há uma mancha nessa foto – a falta de liberdade de expressão e a total imposição do estado sobre tudo e todos.
As pessoas estão sufocadas porque não podem desfrutar de seus direitos básicos de liberdade de expressão.
Em primeiro lugar, não há mídia independente, nem oportunidade de dizer uma palavra sobre práticas erradas em quase todos os campos da vida pública e privada.
Não é à toa que o Turcomenistão é listado entre os países mais notórios do mundo com a pior liberdade de comunicação.
Nas últimas duas décadas, desde que tornou-se independente da União Soviética, o Turcomenistão regrediu: não há acesso ao mundo exterior, não há uma única palavra de crítica sobre a total corrupção entre autoridades de todos os níveis, sobre o crime organizado.
Nos últimos 20 anos, dezenas de jornalistas foram mandados para a prisão e torturados, apenas por fazerem contatos com a mídia estrangeira. Falta justiça em relação às pessoas comuns, há discriminações étnicas e muito mais coisas sobre as quais a mídia estatal mantém-se calada.
Qual é a razão por trás de tudo isso? Medo do ditador turcomeno de perder o poder. Talvez esse temor seja muito comum em todos os regimes ditatoriais – medo de perder o controle sobre as mentes das pessoas.
Não há eleições livres e justas desde 1991, quando o país ganhou independência. O autoconstruído líder turcomeno, Saparmyrat Nyyazow, declarou-se “Pai de Todos os Turcomenos”, reinando por quase 15 anos até sua morte em 2006.
Seu sucessor, Gurbanguly Berdimuhamedow, que prefere ser chamado de "Protetor de Todos", também governa sem ter sido eleito por meio de eleições livres e justas.
Nem uma única palavra de crítica é permitida, embora haja dezenas de razões para protestar contra a corrupção avassaladora e contra a ausência de eleições livres e justas.
O que o Turcomenistão precisa é liberdade de expressão, nada mais."
"Há apenas duas semanas, foi morto o quarto jornalista na Somália neste ano. Mohamed Ibrahim Rage, que trabalhava para uma emissora de rádio controlada pelo estado, foi assassinado a tiros por pistoleiros desconhecidos enquanto voltava do trabalho para casa. Nenhum grupo assumiu a responsabilidade pelo assassinato.
A Somália é um país sem um governo central efetivo desde que o líder militar, o presidente Mohamed Siad Barre, foi derrubado por rebeldes armados, em 1991.
Desde então, o país enfrenta anos de luta entre dezenas de comandantes militares e grupos radicais islâmicos. Não houve autoridade central que fosse capaz de lidar com os assassinatos de jornalistas e também alguns outros desastres naturais, como secas, fome e doenças que levaram à morte de até um milhão de pessoas.
Conhecido como o “Chifre da África”, a Somália é considerada um dos lugares mais perigosos do mundo para atuar como jornalista. O país tem uma longa história de assassinatos de membros da mídia. Os jornalistas são alvejados por pistoleiros e, às vezes, são mortos em ataques suicidas com bombas. No ano de 2012, houve o maior número, e foi o mais fatal registrado para a imprensa na Somália. Dezoito jornalistas e profissionais de mídia foram assassinados em 2012.
O número de assassinatos aumentou dramaticamente nos últimos seis anos, período em que os grupos islâmicos passaram a operar na Somália. O suspeito usual é a al-Shabaab, organização ligada à al-Qaeda que vem enfraquecendo militarmente e foi expulsa da capital, Mogadíscio, em 2011 pelas forças do governo somali com a ajuda das forças da União Africana no país. Apesar da relativa tranquilidade na cidade, os assassinatos de jornalistas continuaram.
Com status internacional para ser um dos países mais fatais do mundo para jornalistas, o país sofre de completa ilegalidade, falta de instituições nacionais, e há infraestrutura e recursos severamente limitados para os jornalistas atuarem em um ambiente seguro.
Os jornalistas que atuam na Somália vivem em constante medo e nenhum deles, independentemente de trabalhar para uma mídia controlada pelo estado ou independente, sabe quem será a próxima vítima, nem quando ou onde.
Um governo nacional somali permanente está no poder desde setembro do ano passado, mas, apesar de seu declarado compromisso de proteger os jornalistas e tomar medidas, até agora tomou poucas medidas para levar os responsáveis por crimes à Justiça."
"Quando se trata de cobertura jornalística no Irã, onde a política é dominante e exerce um forte controle na nova agenda, jornalistas esportivos têm algumas vantagens comparados a outros jornalistas. Enquanto trabalhei como repórter no Irã, o jornalismo esportivo me deu uma chance de circular livremente no ramo, de jornais conservadores a revistas reformistas.
Esporte e política não entram em conflito muito frequentemente e, caso isso ocorra, trabalhar com segurança é muito mais fácil para as pessoas que cobrem esportes. Com certeza, as restrições e a pressão impostas pelas autoridades aos jornalistas são uma prática comum em países como o Irã. Nos últimos anos, soubemos das difíceis condições em que os repórteres iranianos trabalham. Mas hoje eu gostaria de falar a vocês sobre algo de que não falamos todo dia – o direito de um jornalista a um meio de subsistência, como qualquer outra pessoa.
Para mim, a “insegurança” é a Espada de Dâmocles que paira sobre a cabeça de cada jornalista iraniano. Essa espada pode ter diferentes formas. Com certeza, ela muitas vezes assume a forma do assédio e da censura. Repórteres independentes são impedidos de realizar seu trabalho e, em muitos casos, são presos porque as autoridades não concordam com o enfoque de suas matérias.
Nos últimos anos, um grande número de jornalistas fugiu do Irã devido a essas restrições. Mas ainda há muitos que optaram por ficar e trabalhar sob condições difíceis. Para muitos, conseguir se sustentar não é fácil. A sobrevivência muitas vezes envolve considerações como garantir um teto e comida na mesa para suas famílias. É difícil falar de jornalismo profissional no Irã – e em um contexto em que a subsistência é precária.
Os jornalistas, como todos os outros membros da sociedade, precisam de um salário decente e de segurança no trabalho. As baixas remunerações e a péssima situação dos jornais independentes tornam muito atrativa a relativa estabilidade e a riqueza dos jornais apoiados pelo governo. Esses “outlets” de mídia não correm risco de ser fechados e, para muitos repórteres iranianos, essa paz de espírito é escassa.
A necessidade de garantir a subsistência para si próprios e para suas famílias leva muitos repórteres a fazer escolhas de carreira que em outras condições não fariam. A falta de estabilidade e coisas como seguro de saúde, pensão ou pagamento de rescisões se tornam questões sérias a serem pesadas. Essas considerações às vezes levam os jornalistas a violentar sua ética e integridade – uma crítica favorável ao filme feito pelo primo do editor pode parecer um preço baixo a pagar do ponto de vista de um jovem repórter que tenta se manter no emprego.
Então, em um dia como este, quando todos estamos falando sobre as dificuldades que os jornalistas enfrentam diariamente, deveríamos discutir as situações em que o repórter trabalha sob extrema pressão e com grandes riscos. Mas não devemos esquecer que a incerteza assume muitas formas e que o cenário da mídia iraniana nunca estará livre da dúvida e do risco enquanto os jornalistas não forem capazes de garantir sua própria subsistência."